Por Mirko Testa
Uma escuta séria e obediente da Palavra, preparada com zelo, mas também com criatividade, pode ser capaz de envolver muitos fiéis e tornar-se fonte de discernimento, capaz de renovar o caminho da fé e a própria vida cotidiana.
Foi o que disse a ZENIT o padre carmelita Bruno Secondin, professor de teologia espiritual e espiritualidade moderna da Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma.
Na igreja de Santa Maria em Traspontina (www.lectiodivina.it), a poucos passos do Vaticano, padre Secondin conduz, desde de 1996, os encontros de lectio divina, que ocorrem duas vezes ao mês, e que renderam como fruto a coleção Rotem – Ascolto orante della Parola, publicada pela editora Messaggero de Padova (Itália).
Os encontros são gratuitos e abertos a todos os interessados. A escuta orante e dialogante da Palavra é acompanhada por coros meditativos, pausas de silêncio, gestos simbólicos, e também imagens e ilustrações pedagógicas.
A lectio divina, normalmente preparada com base em uma das Leituras do domingo seguinte, ocorre na igreja também para enfatizar a ligação entre a Palavra e a Eucaristia.
À frente da próxima reunião, prevista para 12 de março, estará o padre Marko Ivan Rupnik, diretor do ateliê de arte espiritual do Centro Aletti. O jesuíta esloveno, que trabalhou nos mosaicos da Capela Redemptoris Mater do Palácio Apostólico, é autor, dentre outros, dos mosaicos da fachada do Santuário de Lourdes e da Nova Basílica de São Pio em São João Rotondo, além de ter publicado cerca de vinte livros abrangendo temas como estudos bíblicos e vida espiritual.
– Quais são os frutos desta experiência à frente da lectio divina?
– Padre B. Secondin: Iniciamos em 1996, e até aqui já realizamos 172 destes encontros, se contarmos o que será realizado na próxima sexta-feira. Foi um longo percurso, e também uma experiência preciosa, que exigiu de nós não apenas uma vigilância constante para não profanar a Palavra, mas, ao mesmo tempo, um empenho em encontrar modalidades adaptadas à diversidade dos participantes, sempre em número elevado, o que dificulta uma aproximação mais direta. Contamos com uma média de 200 participantes nos encontros, provenientes principalmente de Roma, mas também de outras regiões. Por isso, desde o início tentamos imprimir um ritmo que fosse capaz de envolver tantas pessoas. A participação de alguns grandes professores, como o cardeal Joseph Ratzinger, Carlo M. Martini, Enzo Bianchi, Gianfranco Ravasi, Bruno Forte, Carlos Mesters e outros nos mostrou uma ampla variedade de abordagens e de riqueza de estilos, que todos apreciaram.
– Mas o público chega a experimentar a Palavra, a pregá-la, a traduzi-la em sua própria vida?
– Padre B. Secondin: Não podemos saber muito a esse respeito. Mas o fato de tantas pessoas participarem e retornarem, buscando se informar sobre os textos bíblicos e recorrendo aos cantos que usamos, é certamente um bom sinal. Os quase 100 mil acessos registrados em nosso site nos últimos quatro anos em meio, a boa divulgação dos nossos livros, e das contribuições, o interesse de muitos párocos e comunidades religiosas por nosso método, e pelas traduções de nossos textos para outros idiomas, também nos indicam algo. Como animadores, consideramos uma grande graça trilhar este caminho com as pessoas e com a Palavra: aprendemos a conhecer e amar a Palavra com seriedade, a transmitir sua chama de verdade e doçura; as demonstrações de carinho que recebemos são um sinal de que a “mão do Senhor” nos acompanha. A frequente exortação do Papa à lectio divina nos faz pensar que estamos no caminho certo. Nós semeamos. O Senhor fará germinar e crescer, de acordo com Sua vontade. Somos seus servos, e temos um grande prazer em sê-lo.
– Transcorridos mais de dezesseis meses desde o Sínodo da Palavra de Deus (de outubro de 2008), o que já sabemos sobre a exortação apostólica pós-Sinodal?
– Padre B. Secondin: O último comunicado oficial sobre a preparação desta “exortação apostólica pós-sinodal” é de junho do ano passado: é o comunicado da Secretaria Permanente do Sínodo, divulgado ao final da terceira reunião do XII Conselho ordinário da secretaria. Neste constava que estaria para ser submetida ao Papa uma proposta, tendo em vista a publicação da exortação. O trabalho foi conduzido visando, entre outras preocupações, “à escuta e leitura orante da Bíblia e sua aplicação na vida pessoal, familiar, eclesial e social”. Esta menção à importância da “leitura orante” (tecnicamente, a lectio divina), corresponde à impressão que se tem vinda dos muito sinais de que o Papa tem uma estima particular pela prática da lectio divina. De fato, ele a recomenda, sempre que a ocasião for adequada, e assume pessoalmente o papel de condutor, como ocorreu por exemplo em sua visita ao Seminário Romano (12 de fevereiro) e no encontro com o clero romano (18 de fevereiro). Os próprios exercícios espirituais desenvolvidos recentemente no Vaticano foram realizados segundo a dinâmica da lectio divina. Sabemos com certeza que a Secretaria permanente do Sínodo concluiu em junho de 2009 seu relatório, enviando-o à Secretaria de Estado de Sua Santidade: este é o organismo que está encarregado, desde então, de concluir o trabalho e providenciar sua publicação. Mas até agora nenhuma informação nova foi divulgada. Esperávamos que o texto fosse publicado no Natal, o que não ocorreu.
– Este atraso na publicação da exortação pós-sinodal poderia indicar que ainda restam dificuldades na redação ou questões delicadas por esclarecer?
– Padre B. Secondin: Pelas informações que me foram disponibilizadas, e por diversas outras fontes, sabe-se que o Papa dá grande importância ao esclarecimento da relação entre a exegese científica e o trabalho teológico. Ele mesmo, com frequência, mostra-se um modelo eficaz sobre essa questão. Sua conferência no Sínodo, na qual abordou justamente esse tema, realizada em 14 de outubro de 2008, tornou-se famosa. A partir desta conferência, foram elaboradas 4 proposições finais. Mas, de modo geral, este tema – o da Palavra – certamente tem implicações profundas também para as relações com outras Igrejas e comunidades cristãs, com os judeus, com o mundo das comunicações e para todas as variadas experiências do uso pastoral da Palavra. Por isso, o texto exige uma redação muito cuidadosa, mas, ao mesmo tempo, que permaneça estimulante e aberta às novas experiências com que temos nos deparado. As próprias Proposições, bem como a Mensagem final, já assinalavam esta complexidade.
Fonte: Zenit