Estamos mais uma vez no período da Quaresma, em que somos chamados pela Igreja a fazer uma caminhada de quarenta dias em preparação para o maior acontecimento do cristianismo: a Páscoa do Senhor, Jesus que venceu o mal, o pecado, a morte e o inferno.
Foi por volta do ano 350 d. C., que a Igreja decidiu aumentar este tempo de preparação para a Páscoa, que era de três dias, que permaneceram como o tríduo sagrado da semana santa: Quinta-feira Santa, Sexta-feira Santa e Sábado Santo. A preparação para a Páscoa passou, então, a ter quarenta dias. Isto aconteceu porque a Igreja percebeu que três dias eram insuficientes para que se pudesse preparar adequadamente tão importante e central evento. Surgia, assim, a Quaresma que inicia na Quarta-feira de Cinzas e se estende até a Quinta-feira Santa na Missa do lava pés. É um tempo de escuta da Palavra de Deus e de conversão, de preparação e de reconciliação com Deus e com os irmãos, de recurso mais frequente da oração, do jejum e da esmola (cf. MT 6,1-6.16-18).
A meta é a expiação dos pecados; pois eles são a lepra da alma. Não existe nada pior do que o pecado para o homem, a Igreja e a sociedade. Se não estivermos cientes dos nossos pecados, não seremos capazes de compreender o sentido profundo da Sexta-feira da Paixão ou da verdade transformadora da Ressurreição. À vista disto a Igreja estabeleceu este período de preparação com o foco principal da nossa conversão e preparação espiritual para bem celebrarmos a Páscoa do Senhor.
E o que podemos fazer durante a Quaresma para que esta preparação seja eficaz?
Esta é uma pergunta que devemos nos fazer se desejarmos encontrar as melhores ações a serem praticadas neste período. E, se em anos anteriores alguém se sentiu de alguma forma culpado por não ter vivenciado a Quaresma com profundidade, ou por não ter se esforçado como deveria, neste ano pode agir diferente, fazendo deste tempo quaresmal um verdadeiro retiro espiritual.
Essencialmente, o período da Quaresma, é um retiro espiritual voltado à reflexão e à ação com o intuito de preparar o espírito dos fiéis para a acolhida do Cristo vivo, ressuscitado, no Domingo de Páscoa. Para isso, a Igreja se inspira no retiro de 40 dias de Jesus no deserto e convida-nos a nos recolher em oração e penitência durante este período. Somos convidados a entrar no deserto, assim como Jesus o fez. Entrar sem nenhuma máscara, para que possamos nos encontrar com Deus, com o irmão e conosco mesmo. Não com a auto-imagem que construímos diante das pessoas – é um convite de desapego e de conversão.
Neste tempo devemos buscar um maior aprofundamento da nossa intimidade com Deus, por isso, estes dias devem ser vividos como tempo de conversão, de oração, de luta contra o pecado, de renovação pessoal e comunitária através da aproximação a Deus e da adesão confiante ao Evangelho. E como linhas de ação para esta caminhada, a Igreja propõe, por meio do Evangelho proclamado na Quarta-feira de Cinzas, a prática da oração, do jejum e da caridade.
Sabemos que para nos aprofundar na intimidade com o Senhor precisamos continuamente investir no nosso aperfeiçoamento espiritual e fraterno, vivenciando durante todo o ano estas três importantes ações que a Igreja acentua no tempo da Quaresma. No entanto, durante o tempo quaresmal, a Igreja espera de nós um maior empenho e disciplina na prática da conversão, do arrependimento, da oração e da caridade nas nossas atitudes do dia-a-dia.
Assim sendo, é muito apropriado fazer um programa espiritual que nos possibilite seguir um caminho de aprofundamento bem definido. Existem muitas maneiras de preparar um programa espiritual e cada um deve encontrar a melhor estratégia de acordo com as suas possibilidades e necessidades. O importante é sair da rotina para vivenciar com profundidade o tempo quaresmal.
Dom Henrique Soares, Bispo da Diocese de Palmares (PE), sugere algumas observâncias bem práticas que nos ajudarão a vivenciar a Quaresma com profundidade para a nossa preparação espiritual:
1. A oração
Devemos aumentar a nossa oração pessoal, o que já oramos e algo a mais que podemos acrescentar. Neste sentido, podemos orar com os Salmos, que poderia ser um Salmo por dia ou nos propor a orar o saltério (os 150 Salmos) durante os quarenta dias da Quaresma. Outras opções seriam meditar a Via-Sacra diariamente, O Santo Rosário, a Liturgia das Horas, etc. O importante é aumentar o tempo de oração pessoal que já fazemos durante o ano.
2. Penitência
A penitência, tradução latina da palavra grega “metanóia”, que na Bíblia significa conversão do pecador, designa todo um conjunto de ações interiores e exteriores dirigidas para a reparação do pecado cometido. São atos como: jejuns, orações, esmolas, vigílias, peregrinações, etc. que os fiéis oferecem a Deus tendo o significado de um sacrifício pessoal. No tempo quaresmal, a penitência proposta é o jejum de alimentos que consiste em retirar alguma refeição no dia em que estivermos fazendo o Jejum, que na Quaresma é na Quarta-feira de Cinzas e nas Sextas-feiras.
3. Caridade
São atos de generosidade e de amor para com o outro que devem ser exercidos na Quaresma como forma de aprofundamento espiritual e fraterno onde devemos fazer um exercício de desapego material ajudando a quem precisa. Podemos ajudar alguém que está necessitando de alimento ou de ajuda financeira, visitar um preso, visitar um idoso solitário em um asilo, uma criança em um orfanato, entre muitas outras formas de se praticar a caridade. Nesta dimensão também podemos praticar a caridade perdoando as pessoas que nos ofenderam ou pedindo perdão àquelas que ofendemos. Podemos também ajudar mais em casa sendo mais amorosos e solícitos. A intenção desta dimensão é melhorar as nossas atitudes em relação aos outros.
4. Ler um livro completo da Sagrada Escritura
Aconselhamos um dos seguintes livros: Êxodo, Números, Deuteronômio ou um dos quatro Evangelhos. Escolha um destes livros e leia-o e medite-o completo durante o período da Quaresma.
5. Combater um vício
Vício é um mau hábito, um costume ruim que toma o lugar de Deus no nosso coração e que nos afasta de Jesus. Escolha um vício para combater contra ele durante estes quarenta dias. Podemos citar como vícios os seguintes hábitos: maledicência, falta de paciência com os outros (pavio curto), vaidade, ira, ciúme, inveja, sensualidade, preguiça e muitos outros.
6. Se confessar
Frequentar o Sacramento da Penitência, procurando neste período um sacerdote para se confessar.
O Papa Francisco também propõe alguns atos de caridade para praticar na Quaresma, que ele classificou como manifestações concretas de amor:
- Sorrir, um cristão é sempre alegre!
- Agradecer mesmo quando não precisa fazê-lo.
- Lembrar ao outro o quanto você o ama.
- Cumprimentar com alegria as pessoas que você vê todos os dias.
- Ouvir a história do outro, sem julgamento, com amor.
- Parar para ajudar e estar atento a quem precisa de você.
- Animar alguém.
- Reconhecer os sucessos e qualidades do outro.
- Separar o que você não usa e dar a quem precisa.
- Ajudar a alguém para que possa descansar.
- Corrigir com amor; não calar por medo.
- Ter delicadeza com os que estão perto de você.
- Limpar o que sujou em casa.
- Ajudar os outros a superar os obstáculos.
- Telefonar para seus pais.
Independente do que decidirmos praticar para aprofundar a nossa conversão e a nossa vida de oração, é importante destacar que os exercícios espirituais que praticamos na Quaresma devem atingir o homem interior, gerando uma metanóia em nosso pensar e em nosso modo de agir, de tal sorte que transforme o nosso coração e a nossa consciência. É este o efeito que devemos esperar se vinvenciarmos com seriedade este momento tão importate para o nosso crescimento espritual e fraterno. Não devemos encarar a Quaresma apenas como um tempo de esforço, de sacrifício ou como um peso que nos esmaga, mas sim, uma oportunidade maravilhosa que devemos receber com gratidão e alegria! Uma alegria do Espírito que ninguém pode nos tirar, uma alegria que as coisas deste mundo não podem nos dar.
Luiz César Martins
Grupo de Oração Fonte Viva do Santíssimo Sacramento.
Curitiba/PR