Chegou a “hora” de Jesus. Estamos na segunda parte do Evangelho de São João e parece se armar um verdadeiro tribunal contra o Senhor. No entanto, é agora que acontece a abertura para quem vem de longe e quer “ver” Jesus! (Jo 12, 30-33). Alguns gregos se aproximaram um dia dos discípulos, pois queriam “ver Jesus”. Era gente de longe, em que podemos vislumbrar a multidão de pessoas que acorreriam a Jesus, durante os séculos futuros, inclusive o nosso, até que ele venha! Compartilhando o “sonho de Deus”, queremos ver muita gente afastada se aproximar, encontrando o regaço acolhedor da Mãe Igreja, no qual as pessoas são reconhecidas pelo nome, recebem o carinho que lhes é devido e são tratadas com misericórdia.
 
E ele mais uma vez fala de sua elevação na Cruz! Uma das leis fundamentais para entrar no Reino de Deus é a do grão de trigo, que morre para produzir muito fruto, e Jesus a anuncia justamente quando chegam os que estavam distantes. Olhemos ao nosso redor, para identificar quanta gente que está à procura e se encontra conosco. Não nos recusemos a aproximar estas pessoas de Jesus, com nossos gestos de acolhida e nossas palavras. Queremos ver Jesus junto com as pessoas que perderam a fé. Algumas delas chegaram a este ponto pela falta de um testemunho coerente que as atraísse. Outras se encontram num emaranhado de questões internas a serem, sem dúvida, respeitadas, mas que as lançam num verdadeiro beco sem saída. Não temos receio de dialogar com elas e desejamos empreender juntos um caminho de busca da verdade.
 
“Venham!” Sonhamos com as pessoas que se entregaram à revolta com a vida, com seus familiares e com Deus. Pensamos naqueles que se tornaram intratáveis, afastados de tudo e de todos, jogados num canto, morando sozinhos, totalmente isolados. Queremos visitá-los e desejamos descobrir irmãos e irmãs que o façam conosco ou em nosso nome.
 
A lei da vida, perder e ganhar, está presente de uma forma ou de outra em nossa existência. Olhando ao nosso redor, quantos são os perdedores? Há gente que a crise econômica fez perder tudo. Há relacionamentos quebrados depois de muitos anos, famílias destruídas, perda de emprego, doenças graves. Não é necessário descrever toda a lista de problemas, conhecidos e experimentados na carne por todos. Só que temos dificuldades para reconhecê-la e dar nome a todos os passos a serem dados. O Senhor Jesus, em quem acreditamos, aquele que o Pai glorifica (Cf. Jo 12,28) é Deus
verdadeiro e homem verdadeiro. Ele assumiu nossa carne, foi até o mais profundo das misérias humanas, percorreu as estradas poeirentas de nossa humanidade e aquelas dos corações angustiados das pessoas. Não teve receio de visitar-nos, como somos e onde vivemos.
 
A Carta aos Hebreus descreve o seu amor infinito encarnado na finitude de nossa humanidade (Hb 5, 7-9): “Ele, nos dias de sua vida terrestre, dirigiu preces e súplicas, com forte clamor e lágrimas, àquele que tinha poder de salvá-lo da morte. E foi atendido, por causa de sua piedosa submissão. Mesmo sendo Filho, aprendeu o que significa a obediência, por aquilo que ele sofreu. Mas, quando levou a termo sua vida, tornou-se causa de salvação eterna para todos os que lhe obedecem”. O segredo é transformar dor em amor!
 
Tomar posse de cada momento presente bem vivido, oferecendo-o a Deus e ao próximo, como gesto de amor e participação no mistério de Cristo. Alguém lhe tira sua fama pessoal, sua riqueza ou sua saúde? Você olha ao redor e vê crises sobre crises? Nas mãos de Deus, o milagre começa agora, acreditando na passagem da morte para a vida, da tristeza para a alegria, das trevas para a luz, do pecado para a graça. Há que se ter cuidado para não pensar em Deus como alguém à nossa disposição para resolver automaticamente nossas demandas de qualquer ordem. Ele já nos oferece, no mistério pascal de morte e ressurreição de seu Filho amado a chave para sair das dificuldades e crescer, sem dispensar o uso de nossa inteligência e boa vontade para buscar soluções. Qualquer situação, sem exceção, pode ser oportunidade privilegiada para amar a Deus e ao próximo.
 
Os que chegaram de longe para adorar a Deus durante a festa dos judeus quiseram ver Jesus. Filipe e André foram os intermediários, serviço que muitos de nós podemos oferecer aos outros! Os dois foram falar com Jesus, que lhes respondeu oferecendo nada menos do que seu segredo, justamente para ser transmitido a gente que chegava de longe, mas era hora de dar tudo! “Chegou a hora em que o Filho do Homem vai ser glorificado. Em verdade, em verdade, vos digo: se o grão de trigo que cai na terra não morre, fica só. Mas, se morre, produz muito fruto”. E oferece o caminho para viver a lei do grão de trigo: “Quem se apega à sua vida, perde-a; mas quem não faz conta de sua vida neste mundo, há de guardá-la para a vida eterna. Se alguém quer me servir, siga-me, e onde eu estiver, estará também aquele que me serve” (Cf. Jo 12, 20-25).
 
A força do Evangelho pode ser oferecida a pessoas que se encontram na miséria ou na fortuna, na tristeza ou na alegria, na saúde ou na doença! A Igreja experimenta a cada dia, onde quer que exerça seu ministério e apostolado, que não há limites! Os de perto e os mais distantes, as periferias geográficas ou existenciais, todas as situações humanas podem ser tocadas com a lei da vida que se encontra em Jesus Cristo, nosso Senhor e Salvador! Quem se dispuser a experimentar, verá como perder é ganhar!
 

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Dom Alberto Taveira Corrêa
Arcebispo de Belém do Pará
Assessor Eclesiástico da RCCBRASIL