O nome de nosso Deus é “Pai e Filho e Espírito Santo”, Deus que se revelou em sua pedagogia na história humana. Somos criados como homem e mulher tendo como origem Deus; criados como “imagem e semelhança” de nosso Deus (cf. Gn 1,26-27), como Set filho de Adão, é imagem e semelhança de seu pai (cf. Gn 5,3). O Pai ao contemplar o seu Filho, a expressão do seu ser (cf. Hb 1,3), nos cria e quer nos plenificar pelo Espírito Santo, o Espírito do Filho, que nos faz clamar “Aba, Pai” (Gl 4,6). É nessa perspectiva que o Catecismo da Igreja Católica, ao explicar a paternidade da primeira pessoa da Santíssima Trindade nos diz, que a linguagem da fé nos apresenta a Deus como “Pai”, porque Deus é a origem primeira de tudo e a autoridade transcendente (cf. § 239). A palavra “av” no hebraico se refere ao pai, o genitor, (cf. Gn 42,13) e ao avô (cf. Gn 28, 13), e Deus se apresenta como o Deus dos “pais” Abraão, Isaac e Jacó (cf. Ex 3,15).

A visão de Deus como Pai, já está presente no Antigo Testamento: “Mas agora, ó Senhor, tu és nosso Pai, nós somos o barro, e tu, o nosso oleiro; e todos nós, obra das tuas mãos” (Is 63,16). “Mas agora, ó Senhor, tu és nosso Pai, nós somos o barro, e tu, o nosso oleiro; e todos nós, obra das tuas mãos” (Is 64,8). Jesus, o Filho de Deus encarnado, nos apresenta a Deus como Pai de forma totalmente nova, Ele traz a relação de Filho na Trindade para restabelecer a nossa relação de criaturas com o nosso Criador. Relação que tinha sido rompida pelo pecado. Assim Jesus nos apresenta esse restabelecimento de relação: “Tudo me foi entregue por meu Pai. Ninguém conhece o Filho, senão o Pai; e ninguém conhece o Pai, senão o Filho e aquele a quem o Filho o quiser revelar” (Mt 11,27). Jesus oferece a nós, seres humanos, pela sua obediência a graça de sermos filhos adotivos e coerdeiros com Ele (cf. Rm 8,17).

Nós intuímos a relação com Deus como nosso Pai a partir da relação que temos com o nosso próprio genitor, o nosso pai. Essa relação foi estabelecida pelo próprio Deus, lembremo-nos que o nosso retorno para Deus começa com um pai humano, Abraão (Gn 12) e o próprio Filho de Deus se submete a um pai humano, São José, e era-lhe submisso (cf. Lc 2,51). Quando Jesus nos diz para não chamar a ninguém de pai, porque somente Deus é Pai, é para declarar que toda paternidade tem por sua origem o próprio Deus (cf. Mt 23, 9). Qual a razão, então, de tanta dificuldade em aceitar a Deus Pai? Por que a desconfiança entra na nossa relação com o Pai? A primeira consequência do pecado é a desconfiança, como Adão e Eva, nos escondemos do Pai (cf. Gn 3, 8), a dominação entra nas relações humanas (cf. Gn 3, 16), e isso tudo transferimos para nosso Deus e Pai. É preciso clamar o Espírito do Filho para nos curar interiormente e termos uma nova relação com o nosso Deus e Pai. O Senhor Jesus, o Filho, vem recapitular a nossa filialidade: “Pai santo, guarda-os em teu nome, que me deste, para que eles sejam um, assim como nós […] Eu lhes tenho transmitido a glória que me tens dado, para que sejam um, como nós o somos; eu neles, e tu em mim, a fim de que sejam aperfeiçoados na unidade, para que o mundo conheça que tu me enviaste e os amaste, como também amaste a mim”. (Jo 17, 11b.22-23).

Ao nascer numa família, recebemos o sustento e o carinho possíveis, a nossa relação com o pai, um homem que pelas suas decisões deveria nos ajudar a viver, conviver e amar. O pai, com sua autoridade, vai nos formando para também lidar com o mundo como ele é e como foi o desejo de Deus, formar filhos que saibam amar e, assim, sejam co-criadores com Ele. Esse é o segredo da verdadeira felicidade! Com o pecado, a dominação vai entrando na relação entre pai e filho e por consequência no nosso modo de amar e ao invés de termos amor, alegria, paciência, benignidade; nossas relações humanas vão sendo marcadas pelo egoísmo, surgindo obras da carne, como luxúria, assassinatos, brigas, desavenças, etc.

Por isso, precisamos nos voltar ao “Pai de misericórdias e Deus de toda consolação” (2Cor 1,3b), o Espírito do Filho, vem ao nosso coração para que possamos verdadeiramente experimentar que Deus é o Pai que tem toda a misericórdia para conosco e nos consola. Consolar significa que o Pai vem para nos ajudar, nos exortar e nos incentivar. Precisamos do Filho e do Espírito para curar nosso coração ferido e retornarmos à plena relação com o Pai. Por isso, que a graça de Deus nos faça novamente clamar: Pai nosso, que estais nos céus…

Padre Micael de Moraes, sjs
Mestre de aspirantes
Seminário Nossa Senhora de Pentecostes