No primeiro dia do mês de novembro celebramos a festa litúrgica do Dia de Todos os Santos. Instituída na Igreja no século IV, era celebrada, a princípio, em Antioquia, no primeiro domingo após Pentecostes, para celebrar os mártires. Em 835, o Papa Gregório IV, a transfere para o dia 1º de novembro, como uma forma de trazer presente a memória de todos os que gozam a visão beatífica de Deus, que nos precedem na Glória e representam a Igreja Triunfante. Assim lembramos na liturgia, quando ouvimos na missa que, no Céu, há uma multidão de santos “intercedendo por nós sem cessar”.

Os santos foram homens e mulheres comuns e ao mesmo tempo extraordinários. E cada um, em seu tempo histórico, deu a sua colaboração para o Reino de Deus e para a mudança do mundo a sua volta. O “sim” ao Evangelho, suas vidas, seu Amor incondicional por Deus, os tornaram pessoas excepcionais para sua época. Muitos com notoriedade fora dos muros eclesiais. Não por outro motivo, São João Paulo II dizia: “A santidade é a força mais poderosa para levar os homens a Cristo”. Poderia citar aqui alguns de minha devoção particular, ou os santos que vou conhecendo porque as histórias de suas vidas em algum momento me interpelam. Mas, propositalmente, hoje falarei de todos, afinal, este é um artigo sobre o Dia de Todos os Santos.

Quando nós católicos rezamos o Credo, professamos que acreditamos na “Comunhão dos Santos” e com isso, declaramos que somos cientes que existe uma união entre a Igreja triunfante (dos que estão na Glória, os santos), a Igreja padecente (os que estão salvos, mas precisam ainda se purificar para alcançar a santidade, purgando suas faltas) e a Igreja militante, que somos nós, batizados, chamados a buscar a santidade em vida, “sem a qual ninguém pode ver a Deus” (Hb 12,14). Acreditar nesta verdade de fé é confiar que nossas orações, nossos atos de fé, nossas boas obras, são esforços que precisamos fazer para um dia podermos ver Deus face a Face. Os santos foram pessoas que desejaram isso, incondicionalmente, com todas as suas forças. Amaram o Amor e deixaram-se amar por Ele. Uns viveram unicamente para Ele e outros morreram por Ele. Por isso, suas preces por nós são perfume suave que agrada a Deus e a intercessão que fazem por nós é poderosa. Afinal, estão diante de Deus apresentando nossas preces. “Vi uma multidão, que ninguém podia contar, de todas as gentes e tribos e povos e línguas. Estavam de pé diante do trono e diante do Cordeiro, trajados com vestes brancas e palmas nas mãos” (Ap 7,14).  

Suas vidas, seus testemunhos, estão a nossa disposição, hoje, não para nos mostrar o quão longe estamos de Deus ou sobre como a vida deles – desses santos – nos é inacessível e impossível de imitar. Mas, a vida dos santos, mostra-nos que é possível, sim, buscarmos a Deus na sinceridade de nosso coração. Penso que esta deveria ser uma preocupação que merece nosso empenho maior. Pois apesar de saber que ninguém é santo sem a graça do Espírito Santo, que é gratuita e doada por Deus, não é possível chegar à santidade sem um esforço mínimo nosso. Deus, que nos fez sem nós, não quer nos salvar sem nossa ajuda. Não podemos ser santos sem nós. Parece algo óbvio e até estranho, mas nem tanto. Já diz a frase inscrita nos Santuários de Schoenstatt, da Mãe Rainha Três Vezes Admirável, onde, em alusão à Aliança de Amor – uma consagração feita a Nossa Senhora, que remete ao nosso batismo e a renovação de nossa aliança com o próprio Deus – está a frase: Nada sem ti, nada sem nós.

Ela lembra o compromisso do batizado em combater contra a mediocridade desse século, que vê, muitas vezes, santidade algo piegas, sem função em nosso dia a dia, incompatível com pessoas como nós. “Agora fulano só quer ser santinho”, “essa outra pensa que é santa”, e com frases assim, vamos percebendo o campo minado para a busca de Deus. Quanto a isso, o fundador do movimento de Schoenstatt, pe. Kentenich, hoje em processo de beatificação, escreve em seus documentos de fundação: “a cada um de nós deve alcançar o mais alto grau concebível de perfeição e de santidade de acordo com o seu estado de vida. Não simplesmente o grande e o maior, mas o máximo deve ser o objetivo dos nossos maiores esforços”.  Nossos esforços. “Nada sem ti, nada sem nós”. No trabalho, na universidade, na família, no namoro, na solteirice, na solidão, em Grupo de Oração, em pastoral, sem movimento ou pastoral, como filhos, como pais, como cônjuges, como avós, netos, sobrinhos, caindo, levantando, caminhando…Enfim, todos, o chamado é para todos e cada um em seu estado de vida. Na santidade nossa de cada dia.

Parece um pouco prepotente ou até muito distante de nós, se analisamos nossa vida. Pecadores, alguns impenitentes, imaturos na fé, às vezes até farisaicos, enfim, vou parar por aqui. Pois podem alguns achar que esta é uma causa impossível.  Mas o fato é que, somos chamados a sermos santos, tal como diz a canção da Comunidade Católica Shalom, “não por presunção, mas por vocação”.  E que reforça o outro refrão, da Comunidade Canção Nova, “Ou santos ou nada!”.

Assim, o Papa Francisco, em 2018, lançou a encíclica Gaudete et Exultate, que trata sobre o chamado à santidade no mundo atual. Em uma mensagem muito lúcida para nossos tempos tão conturbados, fora e dentro a Igreja, o Papa convida a um compromisso com esse nosso chamado a sermos santos e santificarmos o mundo. E ao mesmo tempo, reconhece os desafios, onde lista, também, dois inimigos da santidade: o gnosticismo e o pelagianismo atual. Ele fala, entre outras coisas, do perigo da vontade de ser santo, sem a humildade. Aí vem o contrário do “nada sem ti, nada sem nós”. Entra o ranço de nossos tempos, do que o Papa chamou em discursos recentes pós-Sínodo da Amazônia, de “elites católicas”, referindo-se a grupos extremistas dentro da Igreja, que querem ser santos sem a Igreja. Inventando suas regras ou considerando-se pseudodetentores da Verdade. A vontade é importante para a santidade, mas não devemos esquecer que nosso esforço sem a graça divina, não é nada. O Espírito Santo é quem nos santifica. Ele nos mostra o caminho, nos lapida, nos corrige, nos aperfeiçoa, nos faz querer ser melhores, não para sermos melhores que os outros, mas para sermos melhores para os outros e para Deus. Eis uma sutil, mas importante diferença.

Por isso é importante recordarmos que uma das grandes graças que recebemos com a experiência do Batismo no Espírito Santo é o desejo de buscar a santidade. É querer ser santo! E por isso, termino com sugestões para você que pensou na santidade como algo possível (e me incluo na lista dos que devem seguir): Reze. Peça sempre o Espírito Santo! Seja humilde. Leia a vida dos santos, peça a intercessão deles. Frequente os sacramentos, busque a perfeição. Agindo assim, estarás procurando não os milagres de Deus, mas a Face do Senhor. Isto é bom e agradável a Ele, isso é princípio de santidade.

Termino com as frases do Papa na Gaudade et Exultate (24): “Oxalá consigas identificar a palavra, a mensagem de Jesus que Deus quer dizer ao mundo com a tua vida. Deixa-te transformar, deixa-te renovar pelo Espírito para que isso seja possível, e assim a tua preciosa missão não fracassará. O Senhor levá-la-á a cumprimento mesmo no meio dos teus erros e momentos negativos, desde que não abandones o caminho do amor e permaneças sempre aberto à sua ação sobrenatural que purifica e ilumina”.

Viva o Dia de Todos os Santos! Que vivamos a santidade nossa de cada dia! Amém.

 

Virgínia Diniz Ferreira
Ministério da Comunicação Social
Grupo de Oração Imaculada Conceição – Santa Maria (RS)