O Presépio nos atraiu durante algumas semanas e só agora se completa, com o Dia de Reis e a recordação de outras manifestações do Senhor, no Batismo no Rio Jordão e nas Bodas de Caná, as três chamadas de “Teofanias”. Depois dos pastores, nos quais se fizeram presentes os mais pobres e humildes, o Evangelho e a Igreja nos apresentam os que foram chamados magos sábios ou reis, imaginados em três por causa do ouro, incenso e mirra que levaram a Belém. Foram-lhes atribuídos nomes e a responsabilidade de representar as diversas raças do mundo e a imaginação criativa das sucessivas gerações enfeitou de mil formas as suas figuras.

Em nosso país, as diversas regiões fazem sua memória, dançam e cantam suas viagens, sua esperança e as alegres descobertas, nas Folias de Reis, Reisados e outras manifestações do folclore religioso. É que o Espírito Santo suscitou nos séculos passados preciosas tradições, a maior parte transmitida por tradição oral, com as quais os episódios da História da Salvação continuam a ser apresentados “ao vivo e a cores” em todos os recantos de nossa terra. Nos Magos chegados a Belém, estão presentes as multidões procedentes das periferias geográficas ou existenciais da humanidade.

Companheira fiel dos que das terras mais distantes acorreram a Belém foi uma estrela. Muito já se escreveu a seu respeito e os que estudam os astros podem oferecer detalhes que não ocorrem aqui, pois vale ressaltar o serviço religioso oferecido por ela, inclusive para dar sentido às muitas estrelas iluminadas dos dias que correm.

Estrela que faz o caminho de Belém, para que muitos encontrem o Salvador, o Rei nascido. Sua missão envolve os muitos homens e mulheres que nunca ouviram o nome de Jesus, e ainda uma imensa multidão sem qualquer referência religiosa. No coração humano, foi posta por Deus uma pergunta decisiva a respeito do sentido da vida, com questões que se desdobram em várias direções, com a adesão a uma escola de fé, outras vezes a indiferença e outras tantas até reações amargas. A estrela respeita tal situação e quer oferecer com humildade o serviço de apenas sinalizar que existe rumo, há metas dignas da grandeza do coração humano. Penso em pessoas com as quais convivemos e que hão de ser respeitadas em suas diferenças. Com muitas delas tive ocasião de dialogar. E o diálogo é sempre fecundo quando mutuamente se respeita o valor do outro! A estrela-guia conduziu a Belém de Judá homens das diversas raças que habitam esta terra, apontando para a fonte da fraternidade e da superação de todos os preconceitos, o próprio Deus feito homem.

A estrela presta seu serviço quando as pessoas que assim se respeitam são capazes de compartilhar a luta por valores que dignificam a pessoa humana. Podemos pensar no serviço oferecido ao mundo pelo Papa Francisco, quando, na mensagem para o Dia Mundial da Paz, celebrado há poucos dias, pôs o dedo na ferida da escravidão ainda existente, alertando as forças sociais a se unirem na luta contra esta chaga, propondo que todos sejam acolhidos, não mais como escravos, mas como irmãos. Sabemos o quanto este grito anima muitas pessoas e, graças a Deus, incomoda tantas outras! A estrela e sua mística não são cadentes nem decadentes! Elas permanecem acesas no serviço ao bem comum oferecido pela Igreja.

Estrelas que apontam para o mistério de Deus foram tantas pessoas que nos mostraram o caminho do bem, como catequistas, professores e professoras, bons amigos e boas companhias que foram verdadeiros luzeiros em nossa vida. Estrelas foram os inúmeros exemplos de retidão e lisura que nos foram oferecidos, em tempo de tanta lama, nas quais as pessoas se arriscam a se chafurdarem. Deus seja louvado por nos ter indicado o caminho do bem, e é importante começar o novo ano com os sinais sadios e otimismo nascido da fé, que ilumina nossa compreensão da vida, qual estrela guia para os novos dias.

São parecidas com a estrela de Belém as pessoas que ajudam os outros a discernir na vida, amadurecendo as escolhas a serem feitas. Penso nos jovens que durante o ano que se inicia definirão os rumos de sua vida e eu sonho, olhando para as estrelas, com famílias que os orientem numa perspectiva vocacional, fazendo-lhes a pergunta sobre a vontade de Deus. E esta vontade existe para cada pessoa, pois expressa o olhar de amor do Senhor para cada um de seus filhos e filhas.

A estrela conduz a Belém e de lá faz seus seguidores partirem por outras estradas, ao voltarem para sua terra, com a sabedoria necessária para não entregar justamente o tesouro mais precioso, a quem quer matar o Menino Deus. Iluminados pelo mistério do Natal e da Epifania, vislumbro os novos caminhos a serem percorridos, no exercício da criatividade e na docilidade ao Espírito Santo, pedindo ao Senhor as luzes necessárias. Desafios novos se apresentarão aos cristãos e a todos os homens e mulheres de boa vontade. A beleza do ano que começa estará nas surpresas, pelo que renunciamos a qualquer método de adivinhação ou pretensa previsão mágica. Interessante será viver um dia depois do outro, recolhendo as lições do quotidiano.

Enfim, a estrela renunciou ao defeito do estrelismo! Sua cauda iluminada é feita para mostrar o caminho. Sabe desaparecer na hora certa, depois exercer com fidelidade a sua missão. Esperamos que o ano de 2015 seja como um céu estrelado, com estrelas que não têm receio de piscar, num acende e apaga, jogo de amor, para o encanto dos olhos de Deus e da humanidade.

Rezemos com a Igreja: Ó Deus, que revelastes o vosso Filho às nações, guiando-as pela estrela, concedei aos vossos servos e servas, que já vos conhecem pela fé, contemplar-vos um dia face a face no céu. Amém!

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Dom Alberto Taveira Corrêa
Arcebispo de Belém do Pará
Assessor Eclesiástico da RCCBRASIL