Em tempos de justiceiros que emergem para matar em nome de convicções religiosas, ou de fabricantes de armas que municiam os diferentes lados em conflito, em época de violência institucionalizada, ou enganos vindos de poderosos que burlam a confiança das massas, surge uma proclamação que pode soar anacrônica nos ouvidos de muitos, a convocação de um Jubileu especial, o Ano da Misericórdia, vinda do grande Papa Francisco, para chegar ao coração da humanidade. Vale falar de perdão e de misericórdia, num mundo em que as pessoas só querem exigir os próprios direitos, prontas a processar umas às outras por qualquer expressão inadequada, onde as cercas se erguem para defender o próprio espaço e o medo se torna a regra da convivência? Sim, somos convidados pelo Papa e pela Igreja a nadar contra a correnteza e dizer que existem reservas de bondade e capacidade de reconciliação no coração humano.
O sonho é de Deus, pois “o Senhor tem tanto entusiasmo: fala de alegria e de uma palavra: ‘Sentirei alegria em meu povo’. O Senhor pensa naquilo que fará, pensa que Ele, Ele próprio, estará na alegria com o seu povo. É como se fosse um sonho do Senhor: o Senhor sonha. Tem o seus sonhos. Os seus sonhos em relação a nós. ‘Ah, que belo quando nos encontraremos todos juntos, quando nos encontraremos lá ou quando aquela pessoa caminhará comigo… Naquele momento, sentirei alegria!’ Para dar um exemplo que possa nos ajudar, é como se uma moça com o seu namorado ou o jovem com a namorada (pensasse): ‘Mas quando estivermos juntos, quando nos casarmos!’ É o ‘sonho’ de Deus. Deus pensa em cada um de nós e pensa de maneira positiva, ele nos quer bem, ‘sonha’ pensando em nós. Sonha com a alegria que sentirá conosco. Por isso, o Senhor quer nos ‘re-criar’, fazer com que nosso coração se renove, ‘re-criar’ o nosso coração para que a alegria triunfe” (Homilia na Casa Santa Marta, 16 de março de2015).
Em tempos recentes, a Grécia passa por fases difíceis quanto à sua economia, em busca de soluções para suas dívidas internacionais. Pois bem, foram justamente alguns gregos que se aproximaram um dia dos discípulos, pois queriam “ver Jesus” (Cf. Jo 12, 20-33). Era gente de longe, em que podemos vislumbrar a multidão de pessoas que acorreriam a Jesus, durante os séculos futuros, inclusive o nosso, até que ele venha! Compartilhando o “sonho de Deus”, queremos ver muita gente afastada se aproximar, encontrando o regaço acolhedor da Mãe Igreja, no qual as pessoas são reconhecidas pelo nome, recebem o carinho que lhes é devido e são tratadas com misericórdia.
Queremos ver Jesus junto com as pessoas que perderam a fé. Algumas delas chegaram a este ponto pela falta de um testemunho coerente que as atraísse. Outras se encontram num emaranhado de questões internas a serem, sem dúvida, respeitadas, mas que as lançam num verdadeiro beco sem saída. Não temos receio de dialogar com elas e desejamos empreender, juntos, um caminho de busca da verdade. “Venham!”
Sonhamos com as pessoas que se entregaram à revolta com a vida, com seus familiares e com Deus. Pensamos naqueles que se tornaram intratáveis, afastadas de tudo e de todos, jogadas num canto, morando sozinhas, totalmente isoladas. Queremos visitá-las e desejamos descobrir irmãos e irmãs que o façam conosco ou em nosso nome. O olhar da misericórdia comece pelos mais distantes. Nossas cidades estão repletas de pessoas assim, jogadas ao próprio destino. Encontremos o modo para dizer-lhes “venham!” para a Casa do Pai das Misericórdias.
Abrimos os nossos braços para os que moram nas ruas, e já são várias gerações que não sabem o que é uma casa! São muitos os mendigos de pão, dinheiro e afeto, que precisam reencontrar seu nome e seu lugar na sociedade. Apelo à criatividade de pessoas, grupos, movimentos e pastorais, para que uma nova onda de criatividade apostólica encontre caminhos para chegar a estes irmãos e irmãs. Tenham o espírito missionário necessário para dizer “venham” a estas pessoas.
Descubram seu espaço no coração da Igreja os que estão mergulhados no vício, na tragédia das drogas, de modo especial os jovens que carregam este peso e suas sofridas famílias. Deus nos conceda a graça de oferecer-lhes espaço de conversão, recuperação e reinserção social. Seja a “Fazenda da Esperança” ou outras iniciativas semelhantes o espaço de acolhimento de amor, para que “venham”.
Este é também o tempo para a Igreja ir ao encontro das famílias, sobretudo as que estão divididas e vivem crises mais graves. Nenhuma família, por maiores que sejam seus dramas internos, se sinta abandonada e rejeitada pela Igreja! Cresçam os esforços para chegar a elas o carinho dos cristãos, com o qual são superados os julgamentos e as pessoas consigam dar os passos que lhes são possíveis e “venham”.
Não é difícil perceber que o “venham” não é feito de comodismo, mas se realiza na capacidade de ir missionariamente a todos os que se encontram em situações difíceis. O reduzido elenco aqui apresentado pode se multiplicar, transformando-se numa bela ladainha de iniciativas a serem tomadas. Cada pessoa se revista dos dois papéis! Você pode ser atingido pelo convite da Igreja ou pode se sentir enviado. Há lugar para todos!
O sonho de Deus, expresso de forma magnífica no quinto domingo da Quaresma, soa assim: “Esta é a aliança que farei com a casa de Israel a partir daquele dia – oráculo do Senhor, colocarei a minha lei no seu coração, vou gravá-la em seu coração; serei o Deus deles, e eles, o meu povo. Ninguém mais precisará ensinar seu irmão, dizendo-lhe: ‘Procura conhecer o Senhor!’ Do menor ao maior, todos me conhecerão – oráculo do Senhor. Já terei perdoado suas culpas, de seu pecado nunca mais me lembrarei” (Jr 31, 33-34). Venham compartilhar e construir este sonho, preparando o Jubileu especial do Ano da Misericórdia, no qual a Igreja de Belém acolherá o XVII Congresso Eucarístico Nacional, estação da acolhida e da festa!