por Ronaldo José de Sousa
Consagrado da Comunidade Remidos no Senhor
Sinceramente, tenho medo de morrer. Não pelo que vou encontrar depois, mas por causa do instante da morte. Não me parece que isso seja censurável, visto que o próprio Jesus temeu o momento de sua morte (cf. Jo 12, 27).
É menos provável que eu tenha de passar por sofrimento semelhante ao de Cristo, mas a morte é a separação entre o corpo e a alma. É isso deve doer!
Mas o medo pode ser uma espécie de fascínio. Quem tem medo, no fundo sente-se atraído pelo objeto temido. No meu caso, trata-se de um desejo de tocar o desconhecido e de compreender aquilo que ainda não sei plenamente.
Aliás, demorei a entender as coisas relativas aos novíssimos. Pensava que “mansão dos mortos” era uma casa mal assombrada. “Juízo final”, para mim, eram os instantes últimos de lucidez antes da caducidade. Cheguei a pensar que as pessoas banguelas não iam para o Inferno, pois Jesus insinua que lá “haverá choro e ranger de dentes” (cf. Mt 25, 30b – grifo meu). Espero que não precise de dentistas por lá.
Minhas preocupações escatológicas diminuíram quando descobri que o próprio Jesus morreu e foi para o inferno. Quem diria? Mas é isso mesmo! E para comprovar que não estou dizendo nenhuma heresia, vou recorrer ao Catecismo da Igreja Católica: “O Símbolo dos Apóstolos confessa em um mesmo artigo de fé a descida de Cristo aos Infernos e a sua Ressurreição dos mortos no terceiro dia” (n. 631 – grifo meu).
A Escritura denomina Inferno, Sheol ou Hades, a Morada dos Mortos para a qual Cristo morto desceu. Lá se encontravam todos os mortos, maus ou justos. Todos estavam em estado de privação da visão de Deus, o que não significa que a sorte deles fosse idêntica (cf. n. 633). Os justos estavam à espera do Redentor, pois a salvação ainda não tinha se realizado.
Jesus desceu aos Infernos não para libertar os condenados, nem para destruir o próprio Inferno. Ele foi libertar os justos que haviam precedido. Esta foi, portando, a fase última da missão messiânica de Jesus (cf. ns. 633-634). No dizer de uma antiga homilia para o Sábado Santo: “Ele vai procurar Adão, nosso primeiro Pai, como uma ovelha perdida. Quer ir visitar todos os que se assentaram nas trevas e à sombra da morte. Vai libertar de suas dores aqueles dos quais é filho e para os quais é Deus” (n. 635).
Portanto, a descida de Jesus aos Infernos é um dogma de fé, que todo católico reza no Credo, quando diz: “Desceu à mansão dos mortos”. Sua constatação reforça a fé na misericórdia de Deus. Para salvar, Jesus chegou até o Inferno, “para que ao nome de Jesus se dobre todo joelho no céu, na terra e nos infernos” (Fl 2,10).
É no nome de Jesus que se tem a vida em abundância. Nele, a própria morte se transfigura: em vez de instante último, torna-se passagem. Por isso, sou obrigado a concluir que o meu temor diante da morte é infundado. Devo aguardá-la na certeza de que ela me levará à felicidade eterna. Mesmo que doa…
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Este artigo foi retirado da Revista Renovação, edição nº37 Março/abril 2006. Cadastre-se e receba de dois em dois meses, formação, informação e direcionamentos da RCCBRASIL para você e seu Grupo de Oração.